China e Estados Unidos anunciaram nesta quarta-feira um acordo comercial inicial que reverterá a aplicação de algumas tarifas e incrementará as compras de produtos e serviços americanos por Pequim. O tratado põe fim a uma guerra comercial que já durava 18 meses entre as duas maiores economias do planeta.
Pequim e Washington retrataram a Fase 1 do acordo como um importante passo após meses de vaivéns em negociações, pontuadas por aplicações de tarifas que atrapalharam cadeias de fornecimento e aumentaram temores de maior desaceleração na economia internacional.
— Juntos, estamos corrigindo os erros do passado e entregando um futuro de justiça econômica e segurança para os trabalhadores e fazendeiros americanos e suas famílias — disse o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao anunciar a assinatura do acordo na Casa Branca ao lado do vice-premier chinês Liu He e outras autoridades.
A peça central do tratado de 86 páginas é o compromisso da China de comprar mais US$ 200 bilhões em produtos agrícolas e outros bens e serviços dos EUA ao longo de dois anos, ante uma base de US$ 186 bilhões em 2017.

O acordo inclui US$ 50 bilhões em compras adicionais de produtos agrícolas dos EUA, disse Trump, acrescentando que estava confiante que os fazendeiros do país conseguiriam lidar com a nova demanda. Segundo o tratado, a China vai comprar ainda US$ 52,4 bilhões adicionais em serviços, US$ 77,7 bilhões em produtos industrializados e US$ 37,9 bilhões em suprimentos de energia, como petróleo.
Os produtos industriais a serem adquiridos pelo país asiático incluem maquinário industrial, equipamentos elétricos, produtos farmacêuticos, aviões, automóveis, aço, ferro e instrumentos médicos e ópticos.
No primeiro ano do acordo, de acordo com o texto assinado por Trump e Liu, a China se compromete a comprar US$ 76,7 bilhões em produtos americanos, enquanto outros US$ 123,3 bilhões em aquisições ficam para o ano seguinte.
Autoridades dos dois países saudaram o tratado como o começo de uma nova era nas relações sino-americanas, mas ele ainda não aborda muitas das diferenças estruturais que levaram o governo Trump a iniciar a guerra comercial. Por exemplo, os subsídios chineses a suas empresas estatais, e a prática de inundar mercados internacionais com produtos a preços baixos.
Trump disse que a China prometeu agir para enfrentar o problema da pirataria ou falsificação de produtos, e que o acordo inclui forte proteção a direitos de propriedade intelectual.
Mercados reagem
Com o anúncio do acordo, o índice S&P 500 subiu até quase bater seu recorde histórico. Perto das duas horas da tarde, o índice tinha alta de 6,16 pontos, ou 0,19%, a 3.289,31. Já o índice Dow Jones subia 0,39%, ou 112,69 pontos, a 29.052,36. E o Nasdaq aumentou 17,37 pontos, ou 0,19%, a 9.268,70.
Liu e o FMI
O vice-primeiro-ministro chinês Liu He disse que Pequim e Washington trabalharão juntos após a assinatura da Fase 1 do acordo comercial para obter resultados tangíveis, informou nesta quarta-feira a agência estatal chinesa de notícias Xinhua.
Segundo a agência, Liu disse à presidente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva, e a alguns representantes dos EUA durante uma reunião em Washington na terça-feira que o acordo beneficiará os dois países e o mundo.
Liu também declarou que a China e os Estados Unidos podem trabalhar juntos para alcançar uma relação mutuamente benéfica, apesar das diferenças entre seus modelos político e econômico, disse a reportagem.
Aumento no PIB
Mais cedo, Larry Kudlow, principal conselheiro econômico da Casa Branca, disse numa entrevista que o acordo aumentaria o Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA em 0,5 ponto percentual neste ano e também em 2021.
Mas alguns analistas expressaram ceticismo quanto ao entendimento.
— Acho improvável uma mudança radical nos gastos chineses. Tenho baixas expectativas quanto ao cumprimento das metas anunciadas — afirmou Jim Paulsen, principal estrategista de investimentos do Leuthold Group. — Mas também penso que a negociação foi uma jogada à frente para os dois países.
Tarifas mantidas
O acordo Fase 1 cancelou as tarifas que os EUA iriam impor sobre smartphones, brinquedos e laptops feitos na China, e baixou para 7,5% a taxa original de 15% que colocaria sobre outros produtos do país asiático, como televisões de tela plana, fones Bluetooth e calçados.
Mas manterá as tarifas de 25% sobre US$ 250 bilhões em produtos da China e componentes chineses usados pela indústria americana.
Trump disse que concordaria em remover essas tarifas remanescentes após a conclusão da Fase 2 do acordo, que devem começar em breve, acrescentou.
— Estou mantendo essas tarifas porque, do contrário, não temos cartas na manga com que negociar — disse Trump. — Mas elas cairão assim que terminarmos a Fase 2.
O presidente americano também afirmou que visitará a China num futuro próximo.
— Esse acordo vai funcionar se a C.hina quiser que ele funcione. As pessoas com quem estou negociando querem que ele funcione — afirmou o representante do Comércio dos EUA, Robert Lighthizer.
Cibersegurança na Fase 2
O secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Steven Mnuchin, afirmou nesta quarta-feira que algumas questões de tecnologia e cibersegurança serão resolvidas no próximo capítulo do acordo para acabar com a guerra comercial entre EUA e China.
— Acho que uma quantidade bastante significativa de questões de tecnologia está na Fase 1. Há outras áreas de serviços (fora os serviços financeiros) que estarão na Fase 2. E há certas questões adicionais de cibersegurança que estarão na nova fase — disse Mnuchin à CNBC.
Repercussão na França
Enquanto isso, o presidente da França, Emmanuel Macron, disse esperar que o acordo sino-americano não leve a novas tensões entre EUA e União Europeia.
— Espero que seja uma boa dinâmica. Mas não desejo que esta reaproximação entre chineses e americanos seja uma desculpa para reabrir um novo capítulo de tensões entre os Estados Unidos e a Europa.
China de olho na soja
As importações de soja da China vão crescer em 2020, disse nesta quarta-feira o diretor do departamento de mercado e informações do Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais do país, Tang Ke, sem detalhar as projeções para a expansão.
A China importou 88,51 milhões de toneladas de soja em 2019, acima de 88,03 milhões de toneladas em 2018, mas 7% abaixo das 95,53 milhões de toneladas em 2017, antes do início da guerra comercial com os Estados Unidos.
Os embarques dos EUA caíram em 2019 em meio à disputa comercial entre chineses e norte-americanos, mas importações do Brasil e de outros países cresceram e a oferta foi assegurada, disse Ke.
A demanda chinesa por soja tem sido em parte contida devido a surtos de peste suína africana pelo país, que dizimaram o rebanho de porcos local, reduzido em mais de 40%.